Muitas pessoas conhecem aquela sensação, aquela vozinha dizendo para fazer algo, e enquanto não fizermos, não sossegamos. Aconteceu isso comigo, mas em relação à Elis Regina.
Há uns anos atrás, na minha adolescência, eu era (e continuo sendo) um apreciador voraz de música, onde ouvia amorosa e respeitosamente o que chegava a mim, independente de sua origem. Seja MPB, Heavy Metal, enfim... estaria conhecendo.
Até que alguma coisa me dizia: “Procure Elis Regina!” Parece até um papo de médium, quando psicografa algo do além. Mas, juro que foi bem assim. No entanto, eu conhecia algumas coisas do MPB por intermédio de meu pai e minha mãe, como Belchior, Milton Nascimento, Fagner e Guilherme Arantes. Mas só tinha escutado a respeito de Elis, há tempos antes, como “a maior cantora do Brasil”. E só.

Ao ouvir o disco extraído de um show ao vivo em 77/78 – provavelmente em São Paulo – tive um impacto muito grande. Pois jamais tinha conhecido algo igual. Como ela podia cantar todas aquelas letras, com uma força que vinha das entranhas? Como ela colocava aquela suavidade toda, que nos dava a sensação de ser acariciado por uma mão quente? De onde vinha aquela graça e alegria, que ela injetava nos sambas que cantava impecavelmente? Mil perguntas tomaram meu cérebro enquanto ouvia, repetidamente, aquele disco – e outros em vinil que adquiri posteriormente. A curiosidade me fez ir à Biblioteca mais próxima e procurar um livro sobre ela. E achei: “Furacão Elis” de Regina Echeverria. Li o livro em uma semana e meia, onde sorri, me indignei e chorei muitas vezes, enquanto passava as páginas.

Elis fazia tudo intensamente, sabendo exatamente o que (e como) queria, com coragem suficiente de dizer um “não” quando precisasse, e alegaria seus motivos na frente de qualquer um. Afinal de contas, ela não devia nada a ninguém. Para se ter essa postura, é preciso muita personalidade. Personalidade que a acompanhou, e a definiu absolutamente, na vida e na música. Mesmo tendo partido cedo, ela fez jus ao tempo que viveu, para tornar sua obra atemporal e definitiva.
Na minha humilde opinião, toda cantora que se preze deve aprender algo com Elis. Não estou dizendo para não se espelhar em outras cantoras. Não é isso! Tanto que amo o trabalho de muitas cantoras contemporâneas de Elis, como Nara Leão, Maria Bethânia e Clara Nunes. Essas que citei tem seu valor e lugar na música brasileira, de uma maneira particular. Mas Elis foi a que teve uma qualidade muito rara, até nas cantoras iniciantes de hoje: a ousadia. Tem muita gente fazendo o “mais do mesmo”, e não ousam, não tem coragem de fazer algo mais criativo. Não tem que ter medo de experimentar possibilidades, ou de achar que não vai ser legal, que as pessoas não vão gostar. Pelo contrário. O importante é ser autêntico, ser você mesmo e fazer o que acha certo. E muitas pessoas, com certeza, vão se identificar com o que você passa.
Com esse pensamento, eu procuro fazer meu trabalho de maneira íntegra, extraindo o melhor possível. Como músico, costumo dizer que Elis é minha principal inspiração. Bendita hora em que aquela “voz” soprou em meu ouvido.